CARNAVAL
DE RUA COMO OPORTUNIDADE DE EXERCÍCIO DO DIREITO ÀS CIDADES RIBEIRINHAS DO
BAIXO TOCANTINS (PA)
Edson Antunes
Em abril de
2016 a Revista Latino Americana de
Estudos em Cultura (MATIZES) da UFF/RJ, lançou o dossiê “Múltiplos carnavais:
Economia e política nas manifestações culturais populares”; coube a Marina
Bay Frydberg fazer a apresentação
intitulada: “Quando o carnaval chegar”: Carnavais em
múltiplos e variados enfoques. No texto, Frydberg trás a
historicidade do carnaval, constatando a existência de vários carnavais no Brasil: o carnaval das
escolas de samba, o carnaval de rua, o carnaval dos trios elétricos. Para a
autora, a tradição de se brincar o carnaval foi trazida para o Brasil pela
manifestação popular de origem portuguesa que consistia em atirar nas pessoas
objetos que sujassem e molhassem. A partir da segunda metade do século XIX o
carnaval passa a ser festejada através das sociedades carnavalescas,
organização de pessoas de classe média e alta, que desfilavam fantasiadas, com
carros e bandas de música. Inspirados pelas sociedades carnavalescas, as
classes populares passaram a se organizar em blocos, cordões e ranchos. O
carnaval passa então a ser classificado em “Grande Carnaval”, modo da elite
brincar a festa, e “Pequeno Carnaval”, forma popular da brincadeira
carnavalesca. Foi no final da década de 1920 que surgiram as primeiras escolas
de samba, consideradas por muitos estudiosos como uma síntese de todas essas
outras formas de brincar o carnaval. Criou-se, assim, um modelo de carnaval
que inspirou manifestações festivas por todo o país e também pelo mundo. A
festa carnavalesca brasileira, seja das escolas de samba ou do carnaval de
rua, passou a fazer parte do calendário festivo do país ajudando na construção
da identidade nacional, ganhando contornos regionais e locais em diferentes
lugares do Brasil, sendo uma das características do potencial do carnaval como
elemento construtor de identidade e de práticas de sociabilidade.
O carnaval é sem dúvida uma
festa de múltiplas expressões artísticas e, consequentemente, de variados
significados possíveis de serem interpretados (o carnaval como prática, o
carnaval como identidade, o carnaval e sua relação com o território.), assim,
pode ser pensado como ritual, mas também como organização. Pode ser pensado
como elemento constitutivo do ser, mas também como força política. Pode ser
pensado como arte, mas também como negócio. Pode ser pensado como objeto de
estudo, mas também como elemento constitutivo da identidade do pesquisador.
Na perspectiva de Siqueira & Vasque (2015), o
carnaval também tem haver com o planejamento urbano e o direito a cidade,
apresentando duas abordagens em disputa no modo de apropriação da rua, a saber, “a da urbanização
social e do empreendedorismo urbano”. A primeira está associada à
implementação de uma gramática de direitos que implica não só políticas
redistributivas, mas também ações de reconhecimento no ambiente urbano (
identificação de áreas periféricas como parte da cidade), materializada por
meio do que chamamos de direito à cidade. A segunda vem predominando na
administração das grandes cidades, que vem sofrendo intenso processo de
transformação socioterritorial, ou seja, o urbanismo social remete para a
necessidade de administrar a cidade de modo a torná-la acessível aos seus
residentes, isto é, permitindo-lhes acesso à terra, à infraestrutura urbana e
reconhecendo-os (também) como pertencentes àquele espaço urbano. Já o
planejamento – empreendedorista – por projeto facilita a mobilização de
recursos em escala suficiente para programar grandes blocos de investimentos em
equipamentos urbanos de elevado custo. Nesse sentido a manifestação cultural
possui características próprias fundamentais que podem servir, no caso de uma
gestão conduzida a partir de um empreendedorismo
urbano, para atender aos interesses do capital privado na construção de uma
cidade espetáculo, onde tudo está marcado pela circulação e consumo de novos
produtos urbanos, ou se apropriada pelo urbanismo
social, como forma de construção de uma ambiência diversificada e inclusiva
a partir de uma perspectiva participativa voltada para seus próprios
habitantes.
Ao se fazer uma rápida
analise do carnaval pensado em sua relação com o território, o
carnaval da região do Baixo Tocantins (PA) vem passando por grandes
transformações. A cada ano, os municípios que compõe o território regional se
destacam de alguma forma na história desta que é a maior expressão da cultura
popular brasileira, (festa
que mobiliza milhares de pessoas nas ruas, que popularmente é reconhecido que
só depois dela que o ano começa, em que gira muito dinheiro e que mobiliza manifestações
apaixonadas); recentemente, para além do já consagrado ícone do carnaval
popular paraense, o carnaval de Cametá
(em especial o carnaval das águas), se não o melhor, mas um dos melhores
carnavais do estado, a cidade de Abaetetuba
vem se destacando pela participação de público e grandiosidade de seu carnaval.
No entanto, a visão que vem avançando e tornando-se hegemônica na atualidade
regional, bebe do modelo mercadológico dos “blocos de abadas”, do carnaval pensado como negócio que
pode (com forte interferência externa apropriada
integralmente pela lógica empreendedora capitalista), tirar
a alegria e a espontaneidade dos “blocos de rua” de inspiração do modelo
endógeno originários da cultura e historicidade local, eminentemente popular.
Nesse contexto, em que a
necessidade de intervenção popular passa a ser percebida pelo poder público e
reivindicada por seus citadinos, o conteúdo do direito à cidade passa a incluir acesso a direitos difusos e
sociais, considerando que a festa carnavalesca é gratuita e de natureza
democrática.
Dito isto, defendemos que o papel do poder
público, muito mais de incentivar “cidades espetáculos” é de fortalecer, apoiar e capacitar às
iniciativas de carnaval de rua (blocos de rua, “pequeno carnaval”) que comungam
do ideário do carnaval e sua relação com o território e do urbanismo social,
tais como as já exitosas experiências do “bloco
da bandinha” e do bloco “cara e
coroa” do município de Igarapé-Miri,
blocos eminentemente populares, democráticos e de forte relação à visão citadas
a cima; no sentido de difundir esse modelo e fazer surgir novas experiências
nos bairros baseados no fundamento da organização social e sociabilidades, no
qual os citadinos possam se envolver na construção de suas próprias fantasias,
gerir de forma processual a produção da cidade, usando de suas criatividades,
explorando toda a diversidade sociocultural e socioambiental do território em
tela que possibilite uma nova economia do carnaval com geração de renda para a
região.
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