sexta-feira, 3 de março de 2017

CARNAVAL DE RUA COMO OPORTUNIDADE DE EXERCÍCIO DO DIREITO ÀS CIDADES RIBEIRINHAS DO BAIXO TOCANTINS (PA)

CARNAVAL DE RUA COMO OPORTUNIDADE DE EXERCÍCIO DO DIREITO ÀS CIDADES RIBEIRINHAS DO BAIXO TOCANTINS (PA)
Edson Antunes
Em abril de 2016 a Revista Latino Americana de Estudos em Cultura (MATIZES) da UFF/RJ, lançou o dossiê “Múltiplos carnavais: Economia e política nas manifestações culturais populares”; coube a Marina Bay Frydberg fazer a apresentação intitulada: “Quando o carnaval chegar”: Carnavais em múltiplos e variados enfoques. No texto, Frydberg trás a historicidade do carnaval, constatando a existência de vários carnavais no Brasil: o carnaval das escolas de samba, o carnaval de rua, o carnaval dos trios elétricos. Para a autora, a tradição de se brincar o carna­val foi trazida para o Brasil pela manifestação popular de origem portu­guesa que consistia em atirar nas pessoas objetos que sujassem e molhassem. A partir da segunda metade do século XIX o carnaval pas­sa a ser festejada através das socie­dades carnavalescas, organização de pessoas de classe média e alta, que desfilavam fantasiadas, com carros e bandas de música. Inspirados pelas sociedades carnavalescas, as classes populares passaram a se organizar em blocos, cordões e ranchos. O carnaval passa então a ser classificado em “Grande Carna­val”, modo da elite brincar a festa, e “Pequeno Carnaval”, forma popular da brincadeira carnavalesca. Foi no final da década de 1920 que surgiram as primeiras escolas de samba, consideradas por muitos estu­diosos como uma síntese de todas es­sas outras formas de brincar o carna­val. Criou-se, assim, um modelo de carnaval que inspirou ma­nifestações festivas por todo o país e também pelo mundo. A festa carnavalesca brasileira, seja das escolas de samba ou do car­naval de rua, passou a fazer parte do calendário festivo do país ajudando na construção da identidade nacional, ganhando contornos regionais e locais em diferentes lugares do Brasil, sendo uma das caracte­rísticas do potencial do carnaval como elemento construtor de identidade e de práticas de sociabilidade.
O carnaval é sem dúvida uma festa de múltiplas expressões artísticas e, consequente­mente, de variados significados possí­veis de serem interpretados (o carnaval como prática, o carnaval como identidade, o carnaval e sua relação com o território.), assim, pode ser pensado como ritual, mas também como organização. Pode ser pensado como elemento constitu­tivo do ser, mas também como força política. Pode ser pensado como arte, mas também como negócio. Pode ser pensado como objeto de estudo, mas também como elemento constitutivo da identidade do pesquisador.
Na perspectiva de Siqueira & Vasque (2015), o carnaval também tem haver com o planejamento urbano e o direito a cidade, apresentando duas abordagens em disputa no modo de apropriação da rua, a saber, “a da urbanização social e do empreendedorismo urbano”. A primeira está associada à implementação de uma gramática de direitos que implica não só políticas redistributivas, mas também ações de reconhecimento no ambiente urbano ( identificação de áreas periféricas como parte da cidade), materializada por meio do que chamamos de direito à cidade. A segunda vem predominando na administração das grandes cidades, que vem sofrendo intenso processo de transformação socioterritorial, ou seja, o urbanismo social remete para a necessidade de administrar a cidade de modo a torná-la acessível aos seus residentes, isto é, permitindo-lhes acesso à terra, à infraestrutura urbana e reconhecendo-os (também) como pertencentes àquele espaço urbano. Já o planejamento – empreendedorista – por projeto facilita a mobilização de recursos em escala suficiente para programar grandes blocos de investimentos em equipamentos urbanos de elevado custo. Nesse sentido a manifestação cultural possui características próprias fundamentais que podem servir, no caso de uma gestão conduzida a partir de um empreendedorismo urbano, para atender aos interesses do capital privado na construção de uma cidade espetáculo, onde tudo está marcado pela circulação e consumo de novos produtos urbanos, ou se apropriada pelo urbanismo social, como forma de construção de uma ambiência diversificada e inclusiva a partir de uma perspectiva participativa voltada para seus próprios habitantes.
Ao se fazer uma rápida analise do carnaval pensado em sua relação com o território, o carnaval da região do Baixo Tocantins (PA) vem passando por grandes transformações. A cada ano, os municípios que compõe o território regional se destacam de alguma forma na história desta que é a maior expressão da cultura popular brasileira, (festa que mobiliza mil­hares de pessoas nas ruas, que popu­larmente é reconhecido que só depois dela que o ano começa, em que gira muito dinheiro e que mobiliza mani­festações apaixonadas); recentemente, para além do já consagrado ícone do carnaval popular paraense, o carnaval de Cametá (em especial o carnaval das águas), se não o melhor, mas um dos melhores carnavais do estado, a cidade de Abaetetuba vem se destacando pela participação de público e grandiosidade de seu carnaval. No entanto, a visão que vem avançando e tornando-se hegemônica na atualidade regional, bebe do modelo mercadológico dos “blocos de abadas”, do carnaval pensado como negócio que pode (com forte interferência externa apropriada integralmente pela lógica empreendedora capitalista), tirar a alegria e a espontaneidade dos “blocos de rua” de inspiração do modelo endógeno originários da cultura e historicidade local, eminentemente popular.
Nesse contexto, em que a necessidade de intervenção popular passa a ser percebida pelo poder público e reivindicada por seus citadinos, o conteúdo do direito à cidade passa a incluir acesso a direitos difusos e sociais, considerando que a festa carnavalesca é gratuita e de natureza democrática.
Dito isto, defendemos que o papel do poder público, muito mais de incentivar “cidades espetáculos” é de fortalecer, apoiar e capacitar às iniciativas de carnaval de rua (blocos de rua, “pequeno carnaval”) que comungam do ideário do carnaval e sua relação com o território e do urbanismo social, tais como as já exitosas experiências do “bloco da bandinha” e do bloco “cara e coroa” do município de Igarapé-Miri, blocos eminentemente populares, democráticos e de forte relação à visão citadas a cima; no sentido de difundir esse modelo e fazer surgir novas experiências nos bairros baseados no fundamento da organização social e sociabilidades, no qual os citadinos possam se envolver na construção de suas próprias fantasias, gerir de forma processual a produção da cidade, usando de suas criatividades, explorando toda a diversidade sociocultural e socioambiental do território em tela que possibilite uma nova economia do carnaval com geração de renda para a região.

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